sábado, 30 de agosto de 2014

Seu Wilson

Grande figura seu Wilson! Quarta-feira ele me olhou com uma mala e mochilão descendo pro Rio e perguntou: "tá chegando?" e eu ri (por causa das viagens que estão rolando esse ano) e disse que estava indo. Aí no caminho fui relembrando esse lance de que as viagens são sempre só de ida, não há volta, ainda mais viajando pra São Luís, onde morei a maior parte da minha vida, e as pessoas tendem a perguntar se eu estou “voltando”, mas a vida é só de ida.

No caminho, fui vendo a encantadora vida em Paquetá, com cantos de pássaros e o esplendor da natureza, com sentimento de gratidão pela oportunidade e ensinos e seguindo adiante. Pedalando pela ilha nas ruas desertas vem um clima de cidade perdida nas brumas, algo mágico que se dissipa com um movimento brusco. Dá pra ouvir as ondas do mar da janela do (ainda) quarto, que é um som ancestral desse lugar.

Nos últimos meses todos os dias pela manhã tem aparecido um senhor com seu cachorro na beira da Praia dos Coqueiros andando lentamente de bengala. Ele senta num banco de pedra sob a sombra de uma árvore na esquina que parece um bonsai gigante e toca flauta usando somente uma mão, sempre a mesma música naif a la Syd Barrett usando 3 notas, como um mantra. Ás vezes acompanha tocando pandeiro com a outra mão e também toca gaita e pode chegar a tocar mais de 2 horas, com algumas pausas.

No fim de tarde o vizinho ao lado esquerdo toca piano por mais de uma hora, começando pontualmente às 16h30. Nunca ouço escalas e exercícios, mas sempre é música pra valer, as quais são executadas maravilhosamente e mais de uma vez, com pequenas variações no andamento. Rola altos blues e também uns clássicos. Ontem quando soube da notícia que seu Wilson seguiu a viagem tava rolando uma música bem dramática. Penso que ele toca com a janela aberta de frente para o mar, de onde pode olhar o mar e o pôr do sol.

Esses últimos 10 dias estive aqui em Paquetá nostalgicamente arrumando as coisas e vivenciando o quarto já sem memória visível, com cabides vazios e algumas sacolas desterritorializadas. Os pássaros continuam cantando e os cachorros latem em diversos pontos da ilha e às vezes uivam juntos. O flautista já começou com o som. Seu Wilson disse uma vez que quando morresse queria uma festa e rolou um tambor de crioula no centro do Rio, chamando para pungar no Maranhão e nas voltas que o mundo dá.

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